sábado, 30 de agosto de 2014

Literatura



A Mãe dos Meus Filhos

     Ontem fui ao funeral do velho Macuacua, ele era mazione. Foi graças ao velho, confesso-vos, que hoje eu não tenho medo do mundo obscuro da magia negra. Isto deve-se a larga experiência que tive na inocência da minha infância, eu e os meus amigos, alguns filhos do velho Macuacua, brincávamos com os seus “ objectos perigosos”.

     Em época de campeonatos de futebol no bairro, em que se apostava dinheiro, eu e um dos filhos dele, subtraiamos algum material de trabalho do malogrado, como ervas, e fios coloridos, que posteriormente eram vendidos a todas equipes interessadas na mercadoria.

      Nós não sabíamos a verdadeira utilidade do produto, mas, como bons negociantes, prometíamos resultados fantásticos no final de cada jogo. Depois de fechar o negócio, já com o valor arrecadado, íamos comprar “fioces”, “matoritori “e gelinhos no mercadinho.

     O velho, como um bom “mazione” que se prezava, foi de muitas mulheres. O número de filhos, que passam de 15, denuncia esse fato.

     No fundo acho que sempre me inspirei nesse lado viril e pegador do velho Macuacua . No entanto,  uma dúvida sempre pairou em minha cabeça; sua bendita virilidade era natural ou resultado de uma das receitas misteriosas, misturas que o vi preparar por várias vezes naqueles potes de barro.

     O funeral estava a decorrer normalmente. O pastor prosseguia com a cerimónia, abençoando a sepultura. As viúvas, como se estivessem numa competição, choravam desesperadamente, enquanto os vizinhos e familiares as amparavam. Uma delas chegou a dizer que queria ser enterrada com o malogrado. Os filhos mais velhos (homens), tentavam consolar os mais novos (…). Em suma, toda aquela tristeza característica dos funerais.

     Depois do sepultamento, o pastor da cerimónia pediu que nos organizássemos, para o depósito das flores sobre a campa, como mandam as boas regras fúnebres. A solução foi formar uma coluna, já que o cemitério de Lhanguene está super lotado e decorria outro funeral bem ao nosso lado.

      Já na bicha, dei-me conta de que estava atrás de uma moça. Pela forma do seu corpo já dava para deduzir que se tratava de uma jovem formosa. Mas tive a certeza da minha suspeita quando ela se inclinou para depositar as flores, deixando o traseiro suspenso bem a minha frente.

     E logo que chegou a minha vez, ela me cedeu o espaço, consegui ver a sua cara. Eu, imediatamente, disse para mim mesmo; “quero essa mulher para ser a mãe dos meus filhos”.

      A partir daquele momento ela tomou toda minha atenção. Tanto é que viajei para o futuro, já estava a pensar no casamento e até nos nomes que daríamos aos nossos filhos.

     Fiquei tão envolvido nos meus pensamentos até ao ponto de não ouvir mais o choro das viúvas, e muito menos a pregação do pastor.

     Quando voltei à consciência, só deu tempo de ouvir o pastor dizer; “a cerimonia será interrompida por aqui, e daremos continuidade em casa do falecido. Infelizmente não há transporte para todos, por isso cada um irá da mesma forma que veio ate aqui, Ámen”.

      Com isto, quando dei por mim, quase metade das pessoas que participavam da cerimónia já haviam abandonado o local, certamente para conseguir um lugar num dos carros disponibilizados pela família do malogrado.

     Mas, felizmente, ela ainda estava lá. Diferente dos outros, ela só saiu do local quando efectivamente a cerimónia terminou. E, claro, eu fui atrás, não podia perder ela de vista.

     Já fora do cemitério notei que todos os carros, inclusive o que eu havia apanhado para aquele local, estavam completamente cheios. E, por tal, eu teria de me “virar” para chegar a casa do falecido.
     Entretanto, para mim isso era o de menos, porque assim teria como monitorar os passos da futura mãe dos meus filhos, descobrindo o momento certo para agir. Fiz de tudo para entrar no mesmo chapa que ela e, para minha alegria, consegui.

     Durante a viagem, ela conversava com um grupo de pessoas que também voltava do mesmo funeral. Naquele momento, percebi que, além de bonita, ela era uma pessoa inteligente, devido ao nível, a qualidade de respostas e comentários que ela tecia.

     Quando descemos do chapa eu mantive uma distância de cerca de 10 metros, para poder apreciar mais um pouco aquele andar, na esperança que ela se separasse um pouco do grupo e eu, portanto, pudesse dar a investida - o que não chegou de acontecer até que chegássemos à casa do malogrado, para a continuação da cerimónia.   

     Quando chegamos o pastor já estava no activo. Esperei ela se sentar para depois procurar um lugar estratégico para mim, bem perto dela. Aconteceu tudo conforme o previsto.

     Enquanto o pastor pregava, dizendo “ o velho Macuacua está com os anjos. Redimam-se para que Deus prepare um lugar para vocês no céu”, ela se levantou, e foi fazer uma chamada telefónica, um pouco distante do local onde estávamos.

     Achei aquele momento propício para intercepta-la e fazer o que tinha de ser feito.

     No entanto, antes mesmo do sucedido, por um instante, voltei a viajar para o futuro, pensando na possibilidade de um dia meus filhos me perguntarem; em que local e circunstâncias conheci e conquistei a mãe. Eu certamente teria dificuldades em explicar.

     Por isso que me mantive sentado, peguei no celular e fiz um auto-retrato para postar aqui, na esperança que ela me reconheça, entre em contacto, e que ocupe o lado esquerdo vago em mim.


Mais alto cargo religioso, líder da congregação religiosa denominada Zione (Professante assíduo da doutrina)  

(J.Int)

Autor :  Rito Nobre

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